UMA FAMÍLIA, UM ADEUS E UMA PRAÇA MAIS TRISTE.
Sua família, os Lopes Silva àquela época, agosto de
1954, já era bastante numerosa. Seus pais, Sr. José e dona Laurita, pessoas
maravilhosas que o tempo se encarregou de deixá-los entre nós como verdadeiros
amigos e vizinhos, reporta-nos a uma Taubaté bucólica, com presença marcante de
carros de bois por nossas ruas e meia dúzia de táxi, comumente conhecidos e
chamados por carros de praças, estacionados na Praça Dom Epaminondas à espera
de algum serviço. Naqueles tempos tudo era muito simples e bonito. O leiteiro
com sua carroça vendendo seus produtos em latões e o freguês com sua panela de
alumínio a recebê-lo. Verduras e legumes eram plantados nos quintais e galinhas
e patas anunciavam todos os dias, a garantia de uma boa mistura para o almoço
com seus ovos. Mudamos de Tremembé para a Taubaté no início daquela manhã e do
fatídico dia em que ocorria o suicídio do Presidente Getúlio Dornelles Vargas,
24 de agosto de 1954. Lembro-me bem daquela data, uma tristeza sem fim, uma
comoção nacional. Também naquele dia era oficializada a aposentadoria de papai,
e ali, na Vila José Pedro da Cunha e na rua do mesmo nome, seria nossa
residência por muitos anos. Morávamos há poucos metros da Rodovia Presidente
Dutra e no começo foi difícil nossa adaptação tendo em vista o ronco dos
motores como que anunciando o desenvolvimento do progresso e o surgimento da
indústria automobilística em nosso país. Mas, aos poucos, tudo foi se ajeitando
e logo depararíamos com a construção do Ginásio do Estado, o nosso querido e
sempre lembrado Estadão.
Os vizinhos logo começaram a se formar, como as
famílias de José e Laurita, Juvenal e Maria, Ernesto e Epidaura, Alberto,
Adalgisa e Totinha, Maurílio e Fortunata, Pedro Cunha e Hortência, José Rovida
e Maria, Maria Gobo, José e Irene, Cardoso e Jacira, Antonio e Benedita, Elizeu
e Henriqueta, Marioto e Joana, Sadalla Abraahão e Elza, Maria Japoneza,
Waldomiro e Rita, e tantas outras pessoas que nos trazem lembranças
indeléveis. Os amiguinhos também começariam a fazer parte de nossas vidas,
Jairo, Zezinho, Benedito, Juarez, Altair, Jairo Vinhas, Afonso, Zé
Pedrinho, Jonas, Oswaldão, Mauro, Rossi, Carlos, Rubens, Eduardo, Toninho,
Osvaldo, Mauro, Celso, Carlinhos, Nê, Roberto, Tomaz Edson, Dito,
Estevão, Ditão, Zé Carlos Abrahão, Itaci, Cuca e muitos outros
que se fosse citá-los não caberia nesta memória oportuna.
Outros, já adultos, também fazem parte das
lembranças de nossas memórias, como Osmar, Itamar, Ditinho, Luizinho
Portela, Naná, Abrahão, Caetano, Silvio, Valêncio, Pérsio, Carreiro, Didi,
Paulo, Cilinho, Dudu e tantos outros. Muitos ficaram para trás,
pelos caminhos da vida. Outros, com a Graça Divina, nos enchem de regozijo e de
saudades de um tempo que só teima em povoar nossas mentes, num passado
maravilhoso que não voltará jamais. Mas, ficaram as lembranças, como as de
Jairo, filho do casal José Lopes e Laurita, nascido em Taubaté-SP aos 25 de
outubro de 1947, um sábado da primavera brasileira, a quem me reportei no
início, citando-o como meu primeiro amiguinho. Jairo era aquele colega
inseparável no futebol, na escola, nas brincadeiras de rua, no quintal da
frente de sua casa ou ainda num lote de terreno na esquina de sua casa
improvisado que era como "campo de futebol". O terreno era inclinado
e quem ganhasse o "par ou ímpar" se não bastasse escolher os
melhores, escolhia também "atacar" para baixo. Tudo era
alegria. Alguns anos depois naquele "pedaço de saudade
eterna" chamado campo de futebol se edificaria a casa da Família Abrahão.
Jairo, com seus irmãos, José, Maria Aparecida, Benedito, Joel, Josué, Juarez,
Angelina, Jefit, Laurita, Jair, Marhor, Silvia e Silvio completavam o cenário
de uma família unida e muito feliz. Seu pai, José Lopes, era um competente
funcionário do SAPS e depois da Secretaria do Trabalho em Taubaté. Pessoa da
mais digna retidão, honrado, ótimo vizinho, pai e marido exemplar. Uma família
composta de quatorze filhos, um homem voltado para o bem e um educador na
acepção do termo. Lembro-me do horário do almoço em sua casa onde todos se lhe
acercavam e rezavam naquele momento mágico e sagrado, agradecendo aos céus pela
comida ofertada na mesa. Dona Laurita, uma mulher voltada para o lar e mãe
extremosa, era o exemplo de uma esposa dedicada a uma família feliz. Quantas
noites, enquanto todos dormiam no sono reparador, ela velava em
silêncio os filhos queridos e abençoados! Ah, dona Laurita! Mulheres como
a senhora, afrontam as adversidades da vida, ficam acima
da humanidade e dignificam o mundo.
O viver da nossa infância foi uma bendita e
pródiga passagem em nossas vidas. Época da malhação de Judas Scariotes, dos
balões que fabricávamos, das bolinhas de gude, do pula-pula, do risca faca, do
empinar do papavento, das matinês aos domingos onde o mocinho nunca morria, das
fogueiras de Santo Antonio, São João e São Pedro, dos natais maravilhosos à
espera do presentinho do tão esperado Papai Noel a ser colocado dentro do
sapatinho sobre a janela, quase sempre um carrinho de madeira ou uma bola
de futebol, dos desfiles de 7 de setembro onde a fanfarra do Estadão saía às
06.00 horas do próprio ginásio e, garbosamente, tendo à frente seu grande
expoente, Abrahão, filho do Sr. Sadalla, iniciava o desfile se
dirigindo em marcha para o local de apresentação no centro de Taubaté. Ah,
tempos de outrora! Com o passar dos anos e o inevitável destino de cada um, nos
distanciamos um pouco. Casei-me antes dele e ingressei na Força Pública, atual
Polícia Militar. Pouco tempo depois, Jairo seguiria a mesma trajetória, porém, ingressando
no Serviço Penitenciário do Estado. Passaram-se mais anos e começaram as
despedidas inesperadas e tristes com a perda de nossos pais. Era aquele
negócio, olá, tudo bem? Como está sua família? E seus irmãos? Reflexos de um
progresso abrupto e enganoso, dilacerador de amizades e da convivência diária
Jairo não conseguiria aposentar-se do Serviço Público em razão de optar por
outras atividades, trabalhando muitas vezes sem registro. Mas era uma pessoa de
bem.
Torcedor são-paulino gostava de gozar de outros
torcedores, principalmente de corinthianos, como é meu caso. Certa vez, em 2010
o convidei para irmos a São Paulo, onde trataria de negócios particulares.
Naquela ocasião, estando próximo à Praça da Sé, convidou-me para irmos até o
bairro da Liberdade, ali próximo, maior concentração da colônia japonesa na
Capital Paulista. Lá chegando, perguntei-lhe o que iria fazer ali e em tom
irônico e gozador disse-me: “Nada. Só o trouxe aqui para sentir o gosto de
estar em “Tókio” com o seu Corinthians”, fazendo alusões ao São Paulo F.C. Esse
era o Jairo gozador. Naquele instante pensei em deixá-lo em São Paulo para
voltar de ônibus ou a pé, mas a amizade de cinquenta e seis anos falou
mais alto. Nesse mesmo ano ao abrir uma loja de Pet Shop em Taubaté, convidei-o
a trabalhar comigo, aceitando de pronto. Em virtude da escassez de mão de obra
existente no mercado pet e depois de algum tempo, optei por encerrar as
atividades. No período em que lá permaneceu, Jairo foi um baluarte, um grande
incentivador e mais uma vez, demonstrou toda sua grandiosidade de pessoa amiga.
Jairo sempre foi aquele amigo de qualquer hora, de qualquer dia e em qualquer
situação. Precisasse dele para o que fosse e o ombro solidário e fiel logo se
apresentava para ajudar. Estendia suas mãos sem almejar nada em troca e tinha
de seus amigos a simpatia e o afeto. Agradecia a Deus por cada momento vivido,
e para seus olhos e sua alma, servir a um amigo era uma profissão de fé.
Jairo era casado com Ester, uma enfermeira padrão de alta competência, mãe
dedicada e esposa exemplar, dedicando hoje, todo seu tempo na laboriosa e
eloquente caridade aos velhinhos do Asilo São Francisco de Idosos. Deus saberá
recompensá-la! Carolina, filha única, era a alegria suprema para ambos e
principalmente para Jairo. Para ele, uma jóia de menina e seu diamante
lapidado. Como ele, também foi trabalhar em meu Pet Shop como atendente,
sendo um exemplo de dedicação e organização.
Jairo frequentava todos os dias a Praça Dom Epaminondas. Era seu ponto preferido para ali encontrar seus diletos amigos, colocar as conversas em dia e falar do seu querido São Paulo F.C. Era impressionante seu conhecimento cultural, político e histórico sobre Taubaté quando questionado sobre determinado assunto. Sempre havia uma resposta convincente e inquestionável. Uma fonte inesgotável de conhecimentos. No dia 23 de julho de 2013, passou toda aquela manhã conversando com seus amigos e depois se despedindo, dirigiu-se à sua casa. À noite, sentindo-se mal, foi conduzido ao Pronto Socorro Municipal. Já na madrugada de 24, a triste notícia de seu falecimento, tomando a todos de surpresa. Seu féretro ocorreu no mesmo dia, três meses antes de completar 66 anos de existência. Foi sepultado no Cemitério Municipal de Taubaté, à Quadra 19, sepultura 498, no jazigo perpétuo da família de sua querida esposa Ester. Dessa forma querido e saudoso amigo Jairo, o dia seguinte, 25 de julho, foi muito difícil para todos nós, que, acostumados com a rotina da vida logo estávamos conversando e trocando palavras na Praça Dom Epaminondas.
Jairo frequentava todos os dias a Praça Dom Epaminondas. Era seu ponto preferido para ali encontrar seus diletos amigos, colocar as conversas em dia e falar do seu querido São Paulo F.C. Era impressionante seu conhecimento cultural, político e histórico sobre Taubaté quando questionado sobre determinado assunto. Sempre havia uma resposta convincente e inquestionável. Uma fonte inesgotável de conhecimentos. No dia 23 de julho de 2013, passou toda aquela manhã conversando com seus amigos e depois se despedindo, dirigiu-se à sua casa. À noite, sentindo-se mal, foi conduzido ao Pronto Socorro Municipal. Já na madrugada de 24, a triste notícia de seu falecimento, tomando a todos de surpresa. Seu féretro ocorreu no mesmo dia, três meses antes de completar 66 anos de existência. Foi sepultado no Cemitério Municipal de Taubaté, à Quadra 19, sepultura 498, no jazigo perpétuo da família de sua querida esposa Ester. Dessa forma querido e saudoso amigo Jairo, o dia seguinte, 25 de julho, foi muito difícil para todos nós, que, acostumados com a rotina da vida logo estávamos conversando e trocando palavras na Praça Dom Epaminondas.
Acordamos com saudade de você. Sentamos naqueles
bancos, olhamos os pombinhos a correrem de um lado para outro, as pessoas
caminhando cada qual ao seu destino, as árvores com suas folhas trêmulas pelo
vento frio de um inverno ameno, mas, a pergunta pairava em toda a praça:
"Que falta faz o Jairo!". Somente o tempo, Jairo, esse julgador
imperecível de todas as coisas será capaz de mantê-lo vivo em nossos
pensamentos, em nossos sentimentos e em nossas vidas. Sabe por que, Jairo?
Porque a vida é assim e tem de continuar, agora sem você na mesma praça,
no mesmo banco e com as pombinhas como que balbuciando seu
nome. Tudo continua igual, Jairo! Mas tenha a certeza que estamos
tristes, porque não temos mais você perto de nós para conversar e apertar
suas mãos.
Requiescat in pace,
Saudoso Amigo.
PROFº GILBERTO DA COSTA FERREIRA - HISTORIADOR,
PESQUISADOR E ESCRITOR. COORDENADOR TÉCNICO DO MEMORIAL GENERAL JÚLIO MARCONDES
SALGADO.
cfgilberto@yahoo.com.br
cfgilberto@yahoo.com.br