terça-feira, 20 de agosto de 2013

LEONE MARCHTEIN (21)




 




UMA ALMA GENEROSA E DE MUITA PAZ



Na última semana do mês de março de 2000, caminhando pela Praça Dom Epaminondas, em Taubaté-SP, e ao encontrar com amigos que como eu vão se manifestar do cotidiano de nossas vidas, fui tomado de surpresa pela triste notícia do falecimento de um  grande e estimado amigo, Leone Marchtein. E logo o revi, com os olhos da imaginação, como o via, invariavelmente, sempre defronte à sua loja de móveis da Rua Visconde do Rio Branco a cumprimentar a todos que por ali passavam. Alto, muito bem vestido, dando mostras de sua origem russa, Leone Marchtein era um gentleman, um amigo desses que se encontra de século em século. E dentro dessa pessoa, quanta cortesia, quanta bondade, quanta paz! Sim, paz! Porque sua maior virtude era a de transmitir a paz a quem quer que fosse, de um mendigo ao seu melhor amigo. Filho de Luiz Marchtein e de Raquel Marchtein, judeus russos, nascera aos 19 de abril de 1920, uma terça feira da primavera em Kames-Podolak, na Rússia. Contava-me que suas recordações sempre o levavam até aquela região, onde, juntamente com outros meninos, brincava com seu trenó na neve. Foram momentos marcantes em sua vida, transportadas depois, para um outro Continente totalmente diferente em seus usos e costumes. Mas, aquele menino, também judeu russo, logo daria continuidade à sua infância maravilhosa, conquistando novas amizades e se adaptando rapidamente ao Continente Sul Americano e a um clima situado entre os Trópicos de Câncer e de Capricórnio, completamente antagônico às suas origens.  

Sua família, desembarcando no Porto de São Sebastião, no Rio de Janeiro, dirigiu-se à cidade Sul Fluminense de Barra Mansa, onde começaram a traçar a caminhada de suas vidas. Há indícios de que a escolha para essa cidade fora casual, talvez influenciado por outro passageiro durante a viagem ao Brasil. Foram tempos de difíceis adaptações, em razão principalmente do novo idioma a ser enfrentado. De uma família composta de seis irmãos, e apenas uma mulher, alguns anos depois, seus pais se mudariam para Taubaté, à época, a mais importante das cidade do Vale do Paraíba Paulista, porém, três de seus irmãos lá permaneceriam, estabelecendo-se, constituindo suas famílias e dando continuidade às suas vidas. Em Taubaté, Leone passou a exercer a profissão de vendedor de roupas feitas, primeiramente vendendo a domicílio e depois em sua própria casa, situada na Praça Monsenhor Silva Barros, nº 81, sendo que ainda em sua residência abriria uma pequena loja, adaptada em um dos cômodos. Dessa maneira viria a se destacar como um hábil comerciante, onde, sua marca registrada estava justamente estampada em seu perfil de homem íntegro, educado, leal, e, acima de tudo, honrado.
Na década de 50, decidido como sempre fora, conheceria aquela que seria a grande inspiração e o grande amor de sua vida, Helena, uma moça muito bonita, gaúcha de Porto Alegre, e residente em Taubaté.  Também nessa mesma década Leone despontaria como um grande cantor de canções românticas. Dono de uma linda voz era um fã incondicional das músicas que tocavam os corações, dentre eles, Orlando Silva, Nelson Gonçalves, Carlos Galhardo e Cauby Peixoto, bem como um fã ardoroso de Anacleto Rosas Júnior, este, um compositor de escol das lindas canções de nossas raízes e interpretadas pelos maiores cantores  de nosso país. Certa vez, conhecedor de sua predileção por músicas românticas, perguntei-lhe se havia alguma em especial. E a resposta veio de maneira fulminante: gosto muito de Carlos Galhardo e as músicas "A última inspiração" e "Fascinação" são as preferidas. Leone interpretava as canções românticas de uma maneira muito especial, cantando-as com a alma inspirada de um jovem apaixonado. 
Entretanto, por obra do destino e o destino não acontece por acaso, viria a conhecer João Bonani, o nosso sempre querido, bondoso e conhecido J. Bonani, que com seu pai tinha um programa na Rádio Difusora de Taubaté no início dos anos 50, e onde eram exibidas as mais variadas canções e apresentações de cantores. Aliado a esse detalhe da amizade entre ambos, Leone faria um pedido, quase por clemência para que o ajudassem a conquistar o coração de uma moça chamada Helena, com o intuito de que uma varinha mágica pudesse alcançar Cupido e fazer despertar naquela Bela Adormecida o amor que nutria por ela. Para tanto, solicitou a ambos que o deixassem cantar e desse modo poderia oferecer a música escolhida para aquela que mais tarde seria sua esposa. Também, em outras ocasiões, e sempre por intermédio desses amigos locutores, oferecia-lhe algumas canções e até alguns ensaios de serenatas acabariam por acontecer, contribuindo dessa forma para alicerçar, somar e concretizar o “tão sonhado, acalentado e inspirado desejo”: o amor de Helena.
Um dia, seus olhares se cruzariam e dentre eles surgiria um grande amor. Assim, após algum tempo de namoro e noivado, viriam a se casar em Taubaté, primeiramente no Civil, no dia 1º de fevereiro de 1953 e uma semana depois no religioso, dia 08, na Sinagoga Centro Israelita de São Paulo, localizada na Rua Newtom Prado, nº 76, Bairro da Luz, em São Paulo. Estávamos em pleno verão e há uma semana dos festejos carnavalescos. Os lugares para a tão decantada  Lua de Mel, não poderiam ser melhor escolhidos, tendo como palco a então Capital Federal do Brasil, Rio de Janeiro e a assistirem de camarote e bem juntinhos  do famoso Hotel Glória, a magia do carnaval brasileiro. Depois iriam para Petrópolis, naquele Estado, importante e histórica cidade da Região Serrana Fluminense, onde, no famoso e aconchegante  Hotel Cassino Quitandinha continuariam desfrutando de suas alegrias. Por fim, para concluírem seus sonhos viajariam até São Lourenço, das águas milagrosas das Minas Gerais, onde acabariam por selar aquela união de muito amor e carinho.
Nos negócios, Leone mudaria do ramo de roupas feitas para o de móveis, devido à influência e incentivos de seu irmão Manoel, um competente comerciante de móveis no bairro da Mooca, em São Paulo. Para tanto, inauguraria a acolhedora e próspera Loja de Móveis Carioca, nome esse em homenagem ao habitantes do Rio de Janeiro e  que um dia recebera sua família de braços abertos. Sua clientela era grande devido ao atendimento dispensado com carinho e apreço que Leone dedicava aos seus clientes. Pessoa dotada de uma paz interior imensa e que se estampava em seus olhos, era a extensão na maneira pela qual a todos transmitia. Era o espelho da bondade, a alma caridosa  que procurava estender as mãos ao seu semelhante. Sempre sorridente, solidário e muito prestativo, Leone era a expressão do amor em toda sua plenitude. Um homem de paz voltado para a paz! E daquele sagrado casamento, os frutos seriam colhidos para a alegria da Família Marchtein, com os nascimentos dos queridos e diletos filhos Valdir Jacob, Rosângela, Sueli, Denise, Sérgio, Raquel, Célia, Paulo e Sandro.
Por desígnios do Todo-poderoso, no dia 27 de agosto de 1991, Paulo ficaria para trás na estrada da vida, com apenas vinte anos de idade.  Jovem, bonito, inteligente e um promissor engenheiro, logo viria a sucumbir diante de uma leucemia precocemente detectada, mas que não conseguiria vencê-la. Um doloroso e triste momento para a Família Marchtein. Mas a vida teria de continuar, e, as lembranças sempre saudosas daquele moço cheio de vida e de esperanças serviriam para o alento e continuidade de suas vidas. Como reconhecimento de sua contribuição ao engrandecimento cultural de Taubaté, a Câmara Municipal, através da Lei 2764, de 17 de dezembro de 1993 viria a homenageá-lo postumamente com a denominação de "Rua Paulo Rotband Marchtein - Universitário", localizada no Loteamento Santa Inês, Bairro do Barranco. 
Com o passar dos anos, Leone e Helena começaram sentir a inevitável separação física de seus filhos e seus distanciamentos, que, como eles um dia, viriam a constituir suas famílias. Leone, já alquebrado pelo peso da idade, passou a enfrentar problemas de saúde, acometido que estava por uma insuficiência cardíaca, motivando com isso, sua internação no Hospital São Lucas, em Taubaté. Em 17 de março de 2000, a 01.15 h. veio a falecer vitimado que foi por uma parada cardiorrespiratória irreversível, insuficiência cardíaca descompensada e dupla lesão aórtica, sendo o óbito  atestado pela Dra. Maria Aparecida Nogueira de Barros, CRM 45.940. Seus olhos se fechariam e seus lábios se emudeceriam para sempre. Entretanto, deixaria como legado para todas as gerações que a paz fosse disseminada e que o amor ao próximo se tornasse uma constante. Leone Marchtein foi sepultado no dia 18 de março de 2000, por volta de 16.00 horas, no Cemitério Israelita, situado no Bairro de Butantã, em São Paulo. Como reconhecimento de seu trabalho em prol do engrandecimento de Taubaté, a Câmara Municipal pela Lei nº 3728, de 19 de dezembro de 2003, denominaria como homenagem póstuma  "Rua Leone Marchtein - Cidadão Prestante", localizada no Jardim Marlene Miranda, no Bairro do Itapecerica. A saudade imorredoura, as lembranças infindas e sua passagem entre nós, nos confortam e nos completam com a certeza do Reencontro Prometido nas Sagradas Escrituras. Requiescat in pace, meu grande amigo e irmão Leone. Até um dia!



PROFº GILBERTO DA COSTA FERREIRA - HISTORIADOR, PESQUISADOR E ESCRITOR. COORDENADOR TÉCNICO DO MEMORIAL GENERAL JÚLIO MARCONDES SALGADO. 
cfgilberto@yahoo.com.br

5 comentários:

  1. Parabéns pela Bela História e Demonstração de Amizade pela Memoria do meu Querido Pai - 05/08/2013
    Uma Dissertação Fiel e repleta de sabedoria e detalhes de um Grande Amigo e Escritor. Parabenizo o Autor pela Fidelidade e Fidedigna história sobre o meu Querido Pai Leone Marchtein que tantas Saudades deixou.
    Waldir Jacob Rotband Marchtein

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  2. Muito Bonito!!! - 05/08/2013
    Linda e merecida homenagem ao Sr. Leone (Leib) Marchetin Z''L, esposo de minha tia avó, Helena (Rrayeh Marym) Rotband Marchtein. Que seus descendentes continuem a dar alegrias (Narres) e que o Sr. Leib continue nos influenciando com seus ensinamentos!
    Samuel Rotband Berenstein Grinspun

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  3. Saudades - 05/08/2013
    linda homenagem ao meu tio, adorei.
    Suely Rotband Fischer

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  4. Homenagem maravilhosa!!! - 04/08/2013
    Prof. Gilberto, muito obrigada pela linda dedicatória feita para meu pai, realmente uma história emocionante e que, com certeza, merece ser contada para que todos possam partilhar dessa linda caminhada por ele feita aqui entre nós.
    Denise Rotband Marchtein

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  5. Belas palavras! - 04/08/2013
    Prof. Gilberto, foi emocionante a forma como uniu as palavras para trazer tão belas memórias de meu pai. Obrigada pela gentil iniciativa em nome de toda a família. Abraços.
    Raquel R. Marchtein Santos

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